As oito comunidades que vivem no Estado se uniram para criar um Conselho e compartilhar sua cultura
As oito comunidades da etnia indígena Warao que vivem no Pará se reuniram neste mês para celebrar o 1º Encontro de Cultura Warao, que ocorreu na Usina da Paz Benguí, espaço cedido pela Secretaria de Articulação e Cidadania do Governo do Estado.
Foram dois dias de comemoração com atividades esportivas, dança, canto e contação de histórias com a finalidade de praticar a cultura, reconectar-se às próprias raízes e ensinar suas tradições à comunidade de acolhida.
Além disso, foi o momento de apresentar o Conselho Warao Ojiduna, organização criada pelos indígenas com o objetivo de uni-los e representá-los na busca por participação e direitos. Estima-se que 1.300 indígenas da etnia Warao, oriundos da Venezuela, vivam atualmente no Estado do Pará, majoritariamente nos municípios de Belém e Ananindeua.
“Ao promover a adoção transversal de uma metodologia de proteção de base comunitária, em que colocamos as capacidades e o poder de agência das pessoas refugiadas no centro de nossas atividades, a Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) tem buscado fortalecer as lideranças e famílias indígenas, equipando-as com as informações e ferramentas necessárias para que compreendam seu entorno socioinstitucional e participem plenamente da vida de suas comunidades e da comunidade de acolhida brasileira”, explica a chefe do escritório do ACNUR no Pará, Janaína Galvão.
Preservação da cultura
Artesã e cozinheira, Luísa vive em Belém há oito meses. Ela chegou da Venezuela com os dois filhos pequenos caminhando e pedindo carona até Roraima. Depois de viver um ano em um abrigo da Operação Acolhida, em Boa Vista, ela contou com o apoio da irmã, Gardênia, para reunirem a família em Belém.
“Me doeu muito abandonar meu lugar, minha casa, minha cultura, minha crença. Mas aqui em Belém algumas instituições têm nos apoiado para que possamos compartilhar nossa tradição. Isso é muito bom”, celebra Luísa.
Por sua vez, Gardênia acreditava não ser possível ter direitos em um país diferente de onde se nasceu. O pensamento mudou depois de capacitações oferecidas pelo ACNUR por meio de parcerias. “Hoje, sinto-me uma mulher que pode reclamar seus direitos, questionar e dar conselhos a outras pessoas. Aprendi muito também ao observar os indígenas brasileiros”, relata.
Gardênia e o esposo deixaram seu povoado na Venezuela em novembro de 2019 para encontrar os quatro filhos que já viviam no Brasil. Desde então, passaram por Boa Vista e Manaus. Há dois anos, sem conseguir emprego e vivendo nas ruas, a família decidiu pegar uma balsa até Belém para se estabelecer na comunidade Warao Janoko, ou “Casa dos Warao” em português, localizada no distrito de Outeiro.
Hoje, ela sonha em proporcionar um espaço cultural e uma escola para sua comunidade. “Precisamos ensinar mais aos filhos dos indígenas Warao, mas precisamos aprender mais também. Quero seguir estudando para ajudar os Warao e ser exemplo a outras pessoas, para que sigam estudando”, diz.
O desejo de Gardênia é compartilhado pelo casal Mariluz e Jhonny, lideranças da comunidade Warao Janoko. O casal planeja, ainda, criar uma cooperativa ou associação que também garanta meios de vida às pessoas indígenas refugiadas da Venezuela.
“Queremos isso para o nosso futuro, sem esquecer nossos costumes Warao e ensinando as crianças para que conheçam estes costumes também”, diz Mariluz.
Para Avílio, cruzar a fronteira com cerca de 25 parentes próximos foi um processo doloroso para todos. “Saímos por necessidade, e não porque queríamos. Senti muita dor, pois estávamos deixando nossa família e nossa comunidade, mas também alívio, porque no Brasil há comida”, conta.
Em Belém há três anos e meio, Avílio e sua comunidade também veem o futuro das crianças como uma das principais preocupações. Eles querem que as meninas e meninos tenham oportunidade de estudar sem perder contato com suas raízes.
“Indígenas também têm capacidade de melhorar a vida e manter suas famílias, comprar comida e medicamentos. Todos os Warao pensam assim, querem trabalhar para não estarem nas ruas. Querem estar em uma boa condição, ter uma casa digna. Querem estudar para compartilhar suas ideias, sua cultura”, conta Avílio.
Empreendedorismo Warao
Na semana passada, indígenas da etnia Warao inauguraram um local de venda permanente de artesanato no Mercado de Carne, importante ponto turístico na cidade de Belém. A viabilização do espaço foi feita pela Secretaria de Economia (SECON) da Prefeitura, a partir de articulação do ACNUR e do Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB). Além dessa, outras iniciativas locais para fomentar o empoderamento econômico das comunidades têm sido promovidas por ACNUR e IEB.
Neste mês, 15 indígenas Warao concluíram o curso de Empreendedorismo Digital do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), realizado pelo programa de qualificação profissional “Donas de Si”, da Prefeitura de Belém, por meio do Banco do Povo. O curso foi direcionado a indígenas que, como Mariluz e Jhonny, estão inseridos na cadeia produtiva do artesanato a fim de expandir o acesso ao mercado consumidor com a ajuda de recursos digitais, apoiando a autonomia dessa população. Na comunidade Warao Janoko, a maioria das 25 famílias confeccionam artesanatos.
“O artesanato é nossa cultura. Logo que chegamos, conseguíamos nos sustentar, mas não tínhamos muitas vendas. Com o curso aprendi coisas que não sabia sobre vender pela internet e vamos trabalhar para isso”, explica Mariluz.
Luísa, por sua vez, tem o desejo de abrir um negócio próprio e sustentar a família com a venda de lanches típicos da Venezuela, como empanadas, arepas e hallacas. Isso a levou ao curso de Empreendedorismo Digital. “O curso nos ensinou muitas coisas. O que mais gostei foi sobre publicar nas redes sociais, como podemos usar a internet para vender, e como podemos precificar nosso produto. O professor teve paciência com a gente, e nós tivemos com ele, porque nós não entendíamos o português e ele não entendia o espanhol”, diverte-se.
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