A aprovação, pelo Senado, do projeto que eleva de 513 para 531 o número de deputados federais marca mais um capítulo emblemático da conhecida lógica expansiva do sistema político brasileiro. Em vez de cumprir de forma estrita a decisão do STF — que exigia a readequação da representação proporcional entre os estados com base nos dados do Censo 2022 — o Congresso preferiu o caminho da ampliação, evitando o desgaste político de reduzir cadeiras de estados que perderam população. A solução foi simples, mas reveladora: somaram-se 18 novas vagas e manteve-se tudo como está, ou quase tudo.
O argumento central dos defensores da medida foi a neutralidade orçamentária. Uma emenda incluída - de autoria do senador Alessandro Vieira (MDB-SE) - veda qualquer aumento de despesas com as novas cadeiras até 2030. Mas esse gesto, ainda que louvável do ponto de vista formal, não afasta a percepção de que a solução legislativa adotada foi corporativa e politicamente conveniente. Afinal, como bem alertaram parlamentares contrários, o impacto de 18 novos mandatos vai além de salários — envolve estruturas de gabinete, habitação funcional, articulações internas e até novas disputas por emendas.
Chama atenção o fato de que o Congresso teve mais de uma década para cumprir a exigência constitucional de revisão da composição da Câmara, mas só agiu quando pressionado por decisão judicial. E, mesmo assim, agiu buscando preservar os próprios interesses: nenhum estado perdeu vaga, ainda que isso contrariasse a lógica demográfica. A decisão expõe a fragilidade da autonomia legislativa diante de interesses federativos desiguais e do receio de enfrentar eleitores de regiões que poderiam se sentir “diminuídas” politicamente.
Do ponto de vista institucional, há um risco que não pode ser ignorado: o precedente de que a inércia legislativa pode ser premiada com ampliação. Se, diante da omissão, a resposta é sempre o “acréscimo”, e não a readequação, reforça-se uma cultura política avessa a escolhas difíceis, que prefere contornar os dilemas estruturais com soluções paliativas. Trata-se de uma vitória política, sem dúvida — mas com elevado custo simbólico para a racionalidade do sistema representativo.
A partir de 2027, o Brasil terá uma Câmara mais numerosa, mas não necessariamente mais eficiente ou mais justa. A questão de fundo permanece: o país precisa de mais parlamentares ou de uma representação melhor distribuída e mais qualificada? A resposta a essa pergunta não virá da aritmética, mas da coragem institucional de enfrentar os próprios limites — algo que, mais uma vez, parece ter sido adiado.
Por Brenno Ribas, docente de Direito do UniFavip Wyden – advogado especialista em Direito Eleitoral
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